sábado, 18 de agosto de 2012

PORQUE SAI DO SERTÃO



Eu vim morar na cidade
E deixei o meu sertão
Porque não tive opção
Dentro da realidade
Mesmo na prosperidade
Eu precisei me render
Sem poder me defender
Da violência instalada
Deixei a minha morada
Pra vim pra rua sofrer

O sertão onde eu morava
Era bom que dava gosto
Porque a lua de agosto
O meu rancho clareava
Na hora que eu me deitava
No meu leito de amor
A brisa com seu fulgor
Meu rosto acariciava
E eu baixinho rezava
Agradecendo ao senhor

Quando a matina rompia
Eu estava me levantando
Ouvia o gado berrando
No amanhecer do dia
Meu rosto com água fria
Eu na cocheira lavava
Uma vaca eu desleitava
Pra beber o leito puro
Eu achava que o futuro
Com o presente se encontrava

Depois saia pra roça
Montado no meu cavalo
O trabalho era um regalo
Mesmo estando de mão grossa
Essa alegria nossa
Com o tempo foi mudando
O progresso foi chegando
Com ele a televisão
Mudando a concepção
De quem morava em palhoça

A televisão mostrava
A mulher ser desleal
E a cara do marginal
Que com frieza matava
Como é que assaltava
Ela também exibia
A juventude assistia
Tudo aquilo que passava
Quem era bom não guardava
Porém o ruim aprendia

Aí lá no meu sertão
Começou aparecer
O filho não mais querer
Do pai a sua benção
Porque na televisão
Tudo isso ele via
Achando que a fantasia
Fosse à realidade
Começava a liberdade
Se tornar em rebeldia

Não quero culpar ninguém
Pela tecnologia
E dizer que hoje em dia
Não estou vivendo bem
Porém o progresso tem
O seu lado negativo
Pois torna o homem cativo
Pelas suas invenções
Vivendo sem emoções
O que tem de positivo

Na cidade é diferente
A dormida e o viver
Porque ninguém quer saber
Quem está triste ou contente
Não tem quem visite a gente
Para a gente conversar
Cada uma vai pra um lugar
Só se pensa em diversão
Assistir televisão
E ver o tempo passar

Deixei meu sertão amado
Das fogueiras de São João
Das festas de apartação
De quadrilhas e reisado
Mungunzá e milho assado
Da canjica e da qualhada
Da pamonha e carne assada
Arroz doce e rubacão
Do mocotó com pirão
Arroz de leite e buchada

Hoje eu estou dividido
Entre o campo e a cidade
Porque a minha vontade
Era viver protegido
Estou vivendo escondido
Sem mandar no que é meu
O bandido serei eu?
Que estou nesta prisão
Sem ter absolvição
Meu Deus o que aconteceu

O bandido hoje é munido
De armamento moderno
Anda vestido de terno
E o cidadão desprovido
O homem bom escondido
O bandido na berlinda
Quando é que isso se finda
Eu estou pedindo socorro
Atrás da justiça eu corro  
Mas aqui não chegou ainda

Sei que morro na cidade
E não volto pra o sertão
Por isso que a solidão
O meu coração invade
Pois não tenho liberdade
Por causa da violência
A Deus eu peço clemência
Para que haja justiça
Que diminua a cobiça
E me der mais existência

Adeus Sertão que eu amei
Terra onde eu fui nascido
Porém estou proibido
De relatar o que eu sei
As lágrimas que eu derramei
Foram secas pelo chão
Dentro da minha emoção
Eu tentei me controlar
Se eu só penso em voltar
Por que saí do Sertão? 

Autor: Davi Calisto Neto.








   







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